MADAME SATÃ E A ILHA
GRANDE
“A Ilha Grande é a minha segunda mãe”.
(Madame Satã)
JOÃO FRANCISCO DOS SANTOS (Madame Satã) |
“João foi, como se diz, de tudo um pouco:
malandro, artista, presidiário, pobre e até pai adotivo, até se tornar Madame
Satã, cujo nome foi tirado de inspiração do filme Madam Satan, de Cecil B. De
Mille, em 1930.”
(Por Tatiane Crescêncio 28/02/2006)
“Quando o conheci, já era sessentão... tinha o
físico seco, sólido e razoavelmente musculoso.” - (Oreste Ribeiro)
Infância Perdida
BANDEIRA DE GLÓRIA DO GOITÁ |
BANDEIRA DE PERNAMBUCO |
Chega ao Rio de Janeiro
Ocorre, que numa
viagem à Itabaiana, estado da Paraíba, o menino escravo conhece outro “anjo da
guarda” de nome sugestivo chamado dona Felicidade. Semelhante ao comerciante de
cavalos compadeceu-se da triste situação da criança convidando-o para fugir.
Ele aceitou o convite, e os dois fugiram para muito longe, longe de verdade. Chegaram
ao Rio de Janeiro , em 1908, ano no qual, o Rio, foi chamado pela primeira vez
de “Cidade Maravilhosa”, apelido carinhoso criado pelo escritor e jornalista
maranhense Coelho Neto. Dona Felicidade monta uma pensão de nome Hotel
Itabaiana, onde o pequeno João, aos oito anos de existência, fazia a entrega das
marmitas.
MADAME SATÃ (1972) |
No vai e vem das
entregas, passou a freqüentar a Lapa, onde anos mais tarde se transformaria num
dos malandros mais famosos e respeitados do Rio. Ruas estreitas e sujas, área
de prostituição e jogo, e de muita malandragem. Amor a primeira vista entre
João e a Lapa para onde fugiu em 1913 e foi viver intensamente. Na nova “casa”, viveu como qualquer moleque
de rua daquela época, sobrevivendo apenas do “Deus dará” e pequenos furtos.
Cesto de feira e pé de escada era a sua cama. Em tal circunstância, e vítima de
horrível destino, era preso e apanhava da polícia. Às vezes era socorrido pela
cafetina Catita, mulher imensa de 180 kg que defendia os moleques como se
fossem os seus filhos.
Livrou-se do tormento
da rua, quando conheceu o senhor Bernardo, vendedor de pratos e panelas de
alumínio com quem passou a trabalhar para defender uns trocados. João abandonou
a rua, mas não a Lapa querida. Em 1918, vai trabalhar como garçon na pensão da
Lapa pertencente às madames Gaby, Naneth e Janeth. A relação entre ele e a Lapa
só se interrompeu quando condenado pela justiça, a purgar grande maioria das
suas penas, no famoso presídio da Ilha Grande, em Angra dos Reis, litoral sul
do Rio de Janeiro.
Vida de Malandro na Lapa
Com um malandro e
gigolô chamado “sete coroas” aprendeu a arte do jogo, da navalha, da rasteira e
da valentia. Por volta de 1923, com 1,75 de altura e andar ligeiro, já era
conhecido pelo apelido de Caranguejo, e temido pelo seu murro violento de
esquerda, agilidade e resistência invejável. Era do tipo que não levava
desaforo pra casa e não corria da raia. Entrava numa briga com muito gosto e
coragem. Segundo a lenda, policiais e malandros foram humilhados no confronto
com esse pernambucano que além de ter o “físico seco e sólido e razoavelmente
musculoso”, “caminhava ereto e sempre apressado”. Madame Satã era masculino e feminino, e muito
macho sim senhor.
Um homem alto, magro e
bonito chamado “Brancura”, foi o caso homo-afetivo mais conhecido de Madame
Satã. Viveram juntinhos e felizes durante dois anos, até que um dia Brancura
fugiu para São Paulo, para viver com uma mulher de verdade. Transtornado, foi
atrás do seu grande amor, mas, em vão. Que pena! Arrasado e vencido pelo destino retornou para
o Rio de Janeiro. O bom filho à “Lapa” retorna.
Origem do nome Madame Satã
Desde criança
acariciava o sonho de ser travesti e assim “ser alguém na vida”, o que concretizou
quando se fantasiou para um concurso lançado pelo bloco de carnaval de rua Caçadores de Veados.
Outros rapazes da sua época também curtiam o mesmo sonho. Foi uma oportunidade de ouro para os homossexuais se exibirem com fantasias vistosas para as festas de carnaval da Cidade Maravilhosa.
Certo dia, no Passeio Público (centro do Rio), foi preso com outros travestis e levados para a delegacia. Todos se identificaram com o seu nome de guerra ou profissão, exceto João Francisco dos Santos. O delegado Gonçalves estranhou o fato raro e, encontrando inspiração no título do filme americano Madam Satan (Madame Satã), de Cecil B. De Mille (1930) foi o responsável pelo apelido através do qual ficaria conhecido o lendário malandro da Lapa: Madame Satã. Gabava-se publicamente de ter sido o primeiro “travesti artístico” brasileiro.
CECIL B. De MILLE (Cineasta) Madam Satan - Assita o vídeo no youtub |
Certo dia, no Passeio Público (centro do Rio), foi preso com outros travestis e levados para a delegacia. Todos se identificaram com o seu nome de guerra ou profissão, exceto João Francisco dos Santos. O delegado Gonçalves estranhou o fato raro e, encontrando inspiração no título do filme americano Madam Satan (Madame Satã), de Cecil B. De Mille (1930) foi o responsável pelo apelido através do qual ficaria conhecido o lendário malandro da Lapa: Madame Satã. Gabava-se publicamente de ter sido o primeiro “travesti artístico” brasileiro.
Mais tarde, o pior
aconteceu, enveredou pelo caminho do crime. Costumava dizer que não era
bandido, e sim malandro. Por longo tempo foi considerado o terror do bairro da
Lapa, centro do Rio (capital Federal da época), onde viveu e imortalizou seus
feitos. Aos 29 anos foi preso por homicídio. O motivo foi uma briga entre ele e
o guarda Alberto, dentro de um restaurante, que resultou na morte do guarda que
o havia provocado e humilhado profundamente.
Fugiu, mas foi perseguido pela policia até ser capturado.
Entre uma decepção
homoafetiva e outra, tinha uma recaída. Em 1946, conheceu Maria Faissal com
quem passaria a viver, mas não por muito tempo. Mas, foram bons amigos. Ainda bem.
Nas mãos da justiça dos homens
Madame Satã, enquanto
nas mãos da justiça, respondeu a cerca de 29 processos referentes a agressões,
desacato a autoridade, roubos e prática de um tal de “suadouro” muito comum nos
bordeis (lugar destinado à prostituição) daquela época. Além do homicídio
(guarda Alberto) citado anteriormente. Somados todas as penas contra ele foram
27 anos e oito meses, quase todas cumpridas no presídio da Ilha Grande. Era considerado
um preso de excelente comportamento, relacionando-se bem com todos os
companheiros de infortúnio e direção do presídio. As únicas faltas atribuídas
ele, foram apenas algumas tentativas de fuga, que assim costumava justificar:
“o pior para mim era perder a liberdade...”.
Minha querida Ilha Grande
Depois de longo tempo
vivendo distante da Lapa, o seu coração malandro cedeu lugar a outra paixão:
Ilha Grande, que é a maior e mais bela
ilha de todo litoral fluminense. Afirmava com gratidão: “a Ilha Grande é
a minha segunda mãe”. Depois de cumprir todas as penas, decidiu ficar por ali
mesmo fixando residência na Vila do Abraão. Gostava de curtir sua casinha
cercada por árvores frutíferas como bananeiras, jaqueiras e coqueiros, onde
vivia em paz com a vida e a justiça dos homens. Para se manter, fazia trabalhos
domésticos: lavava roupas para muita gente e cozinhava. Na profissão de
cozinheiro ganhou fama com as suas famosas peixadas a moda Madame Satã,
temperadas com condimentos tirados da mata local. Além de bom cozinheiro era também
bom contador de histórias.
Madame Satã (Pose predileta) |
O sangue carnavalesco corria naturalmente nas suas veias. Durante o período da folia do Rei Momo, tinha o capricho de vestir-se com uma fantasia diferente para cada dia, e divertia-se pra valer. Contam que ele era danado, não dispensa uma noite sequer, e durante o dia saía no “bloco do sujo” com os rapazes da Vila do Abraão.
Pai Adotivo
Como disse a Tatiane
Crescêncio, João Francisco dos Santos foi de tudo um pouco: “malandro, artista,
presidiário, pobre e até pai adotivo...”; tinha uma filha adotiva chamada
Ivonete. Por ela lutou para que “tivesse um futuro digno”. O esforço dedicado
não foi em vão, pois sua filha adotiva tornou-se professora. Afirmava ter
outros filhos adotivos.
Viveu na obscuridade
até 1971 quando foi procurado pelo Jornal Pasquim, único jornal alternativo que
conseguiu sobreviver à ditadura militar (1964-1985). Ele cita na entrevista,
que testemunhou na Praia do Corisco, localizado a cerca de quinze minutos do
cais do Abraão (Ilha Grande), o assassinato de um preso chamado Jatobé,
praticado por dois policiais covardes. A partir daí, volta a ser lembrado não
mais como bandido e, sim, uma lenda que passaria definitivamente a fazer parte
da história do Rio e da Ilha Grande.
Amigos no meio artístico
Carisma e fama
ajudaram-no conquistar amigos no meio artístico. Em janeiro de 1975, trabalhou
na peça teatral Lampião do Inferno, na qual relatava fatos de sua vida na
malandragem. A peça teve vida curtíssima. Os responsáveis pelo projeto de
muitíssimo mau gosto, que conseguiram convencer um idoso de 75 anos,
debilitado, às vésperas da morte, a reviver um passado triste e infeliz,
justificaram o fracasso, afirmando que Madame Satã, não concordava muito em
submeter-se às regras disciplinares da vida teatral. Pode? Por conta disso, foi abandonado e
esquecido, pois tudo indica que queriam apenas explorar o passado miserável de
um ser humano. No ano seguinte... 1976.
Madame Satã No hospital de Angra dos Reis |
Depois desse
lamentável episódio, que possivelmente justifique a sua impaciência, ao
sentir-se doente e debilitado, procurou em Angra dos Reis, socorro médico no
Hospital e Maternidade Condrato de Vilhena (Codrato/Coldrato), onde permaneceu
internado por vários dias como indigente e no anonimato, sem que os médicos
conseguissem identificar a doença que o vitimara. Lá, foi descoberto pelo
Jornal O Globo, que tornou público as condições em que se encontrava o mais
famoso malandro e boêmio do lendário bairro da Lapa.
Últimos meses de vida (um anjo da guarda do 'bem')
“Mesmo, debilitado,
desanimado, mantinha, entretanto, parte do espírito teatral de outrora, como
nas ocasiões em que desabafava para os enfermeiros que cercavam sua cama:
Madame satã, o travesti da Lapa, o marginal perigoso, está no fim. E após uma
pausa, acrescentava: E que fim.”
HÉLIO JAGUARIBE (JAGUAR) Cartunista e Jornalista |
O cartunista Jaguar,
ao tomar conhecimento do fato, compadeceu-se com a triste situação do amigo e,
junto com a atriz Norma Benguell e Joel Barcelos transferiram-no para o
hospital do INPS (INAMPS) de Ipanema, bairro nobre da zona sul do Rio, onde foi
possível diagnosticar “câncer no pulmão em fase avançada”, doença que já havia
comprometido outros órgãos.
Falecimento de Madame Satã - (Hospital do INPS de Ipanema, Rio)
Madame Satã, no Hospital INPS de Ipanema, com a atriz Norma Benguell 22/fev/1976 |
Dois meses antes de
falecer, disse ao repórter do mesmo Jornal: “A morte é o fim de todos. Pois,
que venha logo, que eu não quero ficar entrevado numa cama!”. E assim se realizou
o desejo do coração.
Parabéns ao cartunista
e jornalista Hélio Jaguaribe, o Jaguar, pelo belo ato de humanidade. Valeu
querido irmão.
Pesquisa: Guia José
Carlos Melo / Rio de Janeiro
Fontes e créditos: Rogério Durst/1985; Pedro Luiz; Jornal do Brasil e o Globo; Orestes Ribeiro; Jornal Pasquim e outros.
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Verdade que liberta:
Salmo 41 - Bíblia Sagrada
1. "Bem aventurado é aquele que socorre ao necessitado; O Senhor (Deus) o livrará no dia do mal.
2. O Senhor o protege e lhe preserva a vida, será feliz na terra: não o entrega à vontade dos seus inimigos; na doença tu lhe afofas a cama.
JESUS CRISTO é A NOSSA ÚNICA ESPERANÇA!
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Fontes e créditos: Rogério Durst/1985; Pedro Luiz; Jornal do Brasil e o Globo; Orestes Ribeiro; Jornal Pasquim e outros.
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Verdade que liberta:
Salmo 41 - Bíblia Sagrada
1. "Bem aventurado é aquele que socorre ao necessitado; O Senhor (Deus) o livrará no dia do mal.
2. O Senhor o protege e lhe preserva a vida, será feliz na terra: não o entrega à vontade dos seus inimigos; na doença tu lhe afofas a cama.
JESUS CRISTO é A NOSSA ÚNICA ESPERANÇA!
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